A
imagem tradicional da justiça, construída com a
superioridade e a seriedade da deusa grega Têmis, que tem os
olhos vendados para tratar com igualdade e edificada igualmente por
juízes severos que impõem suas decisões com o
martelo em punho, vai dando lugar, pouco a pouco, a uma justiça
que recebe com sorriso acolhedor, que se coloca no mesmo nível
daqueles que a procuram, que ouve ativamente e de olhos bem abertos
para que possa perceber as necessidades e os sentimentos daqueles que
a buscam e que ostenta mãos estendidas para acolher outras
mãos que lhe procuram e para selar e fazer selar compromissos
não apenas jurídicos, mas também éticos e
morais.
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Dr. Marcelo Malizia Cabral |
Essa
nova justiça, que é humana, sensível, que
valoriza mais as pessoas que os papeis, que fala e deixa falar, que
ouve e se faz ouvir, que possibilita o diálogo igual e
respeitoso, que cultiva e dissemina a empatia, a responsabilidade, o
entendimento e a paz, começa a ser cuidadosa e prudentemente
construída.
Para
que essa construção coletiva pudesse ocorrer foi
necessária a ruptura de um milenar paradigma: em lugar de
cingir-se à prestação da tutela jurisdicional,
ou ao julgamento de processos, a missão do Poder Judiciário
passa a ser bem mais ampla, a de promover a pacificação
social.
Nesse
novo modelo de justiça pacificadora os juízes conseguem
perceber que muitos conflitos não reclamam um tratamento ou
uma solução apenas jurídica; que uma sentença,
por mais bem elaborada que seja, pode ser incapaz de reconstruir
laços rompidos, de provocar o arrependimento, de motivar o
perdão ou de edificar a paz; podem compreender que os
problemas levados ao Judiciário reclamam, em muitas ocasiões,
outras formas de tratamento, diversas do processo ou da sentença.
Nessa
forma diferente de se pensar o Poder Judiciário, os processos,
as sentenças e os juízes não são as
únicas ferramentas para o tratamento e para a solução
de um conflito; nessa inovadora justiça, os juízes
cedem lugar aos conciliadores, aos mediadores, aos facilitadores de
justiça restaurativa; as audiências formais são
substituídas por boas rodadas de conversa; as sentenças
que impunham obrigações abrem espaço aos
acordos, aos termos de entendimento, aos compromissos voluntários
e recíprocos.
Essa
é a justiça nascente, que queremos sedimentar neste
novo milênio: uma justiça promotora da paz social,
próxima, acessível, desburocratizada, horizontal,
rápida, eficiente, que tem voz e sabe ouvir, que olha bem nos
olhos e se deixa ver, que acolhe com um sorriso, que dialoga, que
estende as mãos e guarda a força do martelo
exclusivamente para aqueles casos em que o sorriso, o diálogo
e a mão estendida não frutifiquem.
Para
a satisfação dos gaúchos, o Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul tem ocupado lugar de destaque no cenário
nacional na promoção dessa nova justiça,
ofertando conciliação, mediação e justiça
restaurativa às comunidades, possibilitando que as pessoas
busquem a restauração da paz em suas relações
junto aos Centros Judiciários de Solução de
Conflitos e Cidadania, mesmo sem a necessidade de um processo
tradicional e até mesmo fora dos ambientes dos Foros, em
Escolas, Centros Comunitários, Universidades, Centros de
Referência em Assistência Social ou, ainda, nalguns
casos, virtualmente.
Que
a justiça do século XXI além de oferecer uma
jurisdição eficiente, promova o entendimento entre as
pessoas e realize a tão almejada pacificação
social.
Marcelo
Malizia Cabral, juiz de direito coordenador do Centro Judiciário
de Solução de Conflitos e Cidadania da Comarca de
Pelotas, RS – maliziacabral@gmail.com
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