História curiosa envolveu microempresária que vende salgados e funcionários de uma loja de eletrônicos da cidade do sul gaúcho.
O juridiquês deixa ainda mais curioso o termo da audiência cível realizada sexta-feira (10), em Pelotas: "Os mediandos acordaram no sentido de encerrar o litígio com o oferecimento de duas caixas de bombons, uma para a autora e outra para o seu procurador, com pedido de desculpas independentemente do reconhecimento de culpa, ficando disponíveis, nesta data para retirada na loja".
A história por trás da decisão inusitada do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania começou há cerca de um ano, quando a microempresária Maria de Lourdes Furtado — segundo ela mesma, mais conhecida no calçadão de Pelotas como Alemoa, Xuxa ou Ana Maria Braga, agora que cortou o cabelo — entrou em uma loja de eletrônicos e escorou a bandeja dos salgados que vende aos transeuntes do Centro no balcão de celulares. A loja pediu para não ser identificada, bem como seus dois funcionários. A bandeja, segundo Maria de Lourdes, foi escorada ali para cobrar a conta mensal dos funcionários em seu caderno de "pendura". Repreendida pelo gerente da loja, ela prontamente se ofendeu.
Aqui, segundo os representantes da loja, aconteceu um mal-entendido. Maria de Lourdes entendeu que fora proibida de vender seus salgados aos funcionários e de trabalhar em frente à loja. A loja nega. Diz que a determinação era apenas que não acontecessem vendas dentro das dependências. A microempresária também interpretou o suposto veto ao seu trabalho como uma determinação de outro funcionário, o gerente-regional da loja.
Aqui, segundo os representantes da loja, aconteceu um mal-entendido. Maria de Lourdes entendeu que fora proibida de vender seus salgados aos funcionários e de trabalhar em frente à loja. A loja nega. Diz que a determinação era apenas que não acontecessem vendas dentro das dependências. A microempresária também interpretou o suposto veto ao seu trabalho como uma determinação de outro funcionário, o gerente-regional da loja.
Horas depois, ainda furiosa, Maria de Lourdes cruzou com um conhecido, o advogado Róger Recart Tomaz:
— O que aconteceu, Alemoa?
— Nada, nada.
— Como nada? Tu está com o queixo roxo e tremendo de braba. O que aconteceu?
Maria de Lourdes contou sua versão da briga, e Róger ofereceu ajuda para entrar na Justiça. Questionado sobre quanto cobraria, respondeu que seria 20% do valor de uma eventual indenização.
— Te dou 40%. Não é pelo dinheiro _ respondeu a microempresária.
Entrariam com um processo pedindo R$ 7 mil de indenização por danos morais. Enquanto isso, Maria de Lourdes cortou relações com o gerente-regional. Deixaram até de se cumprimentar na rua. Com o orgulho ferido, ela também abandonou o ponto de vendas. A mágoa acumulada fez com que a audiência de conciliação, pedida pela Justiça e ocorrida na sexta-feira, durasse mais de duas horas.
— Quando a audiência começou, percebi que ela estava com um ódio mortal de mim. Pô, e eu também estava me sentindo meio injustiçado com aquele tratamento. Mas tentei falar, com jeito, que não havia sido uma determinação minha. Era uma norma da empresa, e o nosso gerente apenas cumpriu. Mas também procurei esclarecer que não havia cabimento na ação.
Fonte: Matéria do Jornal Zero Hora, publicada em 11/08/2018.
Fone: (53) 32794900, r. 1410.
Nós não proibimos ela de vender do lado de fora nem aos funcionários. Sequer temos esse poder — conta o gerente-regional.
"Gostaria que eles trabalhassem como garis por alguns dias. Nada contra os garis. Só para eles saberem como é trabalhar na rua. Como você é tratado por pessoas quando elas se acham melhores do que tu". MARIA DE LOURDES FURTADO, Microempresária
Em determinado momento, os mediadores pediram para ficar a sós com Maria de Lourdes e seu advogado. Como ela insistia que o valor da indenização não era o xis da questão, os mediadores perguntaram que tipo de compensação de parte dos funcionários da loja a deixaria satisfeita.
— Respondi que gostaria que eles trabalhassem como garis por alguns dias. Nada contra os garis. Só para eles saberem como é trabalhar na rua. Como você é tratado por pessoas quando elas se acham melhores do que tu — conta a microempresária.
Os mediadores responderam que aquilo não seria possível, mas que ela atentasse para o fato de que a audiência já estava servindo para que os funcionários se dessem conta de que poderiam tê-la tratado, no mínimo, com mais gentileza. Um deles, o gerente que a abordara, estava segurando as lágrimas do lado de fora da sala. Segundo seu advogado, Maria de Lourdes reparou nos olhos do rapaz, depois, e o coração amoleceu um pouco. O gesto final veio do gerente-regional.
— Olha, Alemoa. Se eu te ofendi sem querer, não te peço nem desculpas, te peço perdão mesmo — disse.
Ok, mágoa dissipada e mal-entendido desfeito. Mas e os honorários do advogado, como ficariam? Era preciso recompensá-lo pelo trabalho. Róger disse que abria mão de pagamento, mas recomendava um gesto simbólico. Um buquê de rosas, talvez. O gerente-regional sugeriu, então, uma caixa de bombons para cada um. O advogado topou de pronto. A microempresária, com algumas restrições.
—Não me venha com bombom vagabundo. E eu vou lá na loja buscar ainda hoje — decretou.
De fato, a Alemoa apareceria na loja duas horas depois, quando os bombons ainda estavam a caminho. No final da audiência, o gerente-regional pediu um abraço e que constasse uma observação na ata da audiência: "Ademais, a autora se compromete a seguir comercializando seus produtos na frente da referida loja, respeitando as normas desta".
— Eu não queria ficar mais um ano sem os salgados e o café dela. Que, de fato, são muito bons — conta.Fonte: Matéria do Jornal Zero Hora, publicada em 11/08/2018.
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